terça-feira, 9 de setembro de 2014

O QUE NOS FAZ BONS OU MAUS
CARLOS ALEXANDRE NETTO
Neurocientista e reitor da UFRGS

 Diariamente, nos comovemos com histórias de sofrimento e solidariedade, e nos sentimos inconformados com a injustiça e com as guerras. Somos seres morais e a moralidade, construída a partir da percepção de bem e mal, é um dos pilares da vida em sociedade.
Paul Bloom, psicólogo cognitivo que vem a Porto Alegre participar do Fronteiras do Pensamento, defende que já nascemos com algum senso de moral, de equidade e de justiça. Para comprovar sua hipótese ele encarou o difícil desafio de estudar a mente dos bebês. Pode parecer espantoso, mas pais e mães sabem que todos nascem com um repertório de comportamentos que se desenvolvem rapidamente, sobretudo as expressões de desconforto, prazer e alegria.
No laboratório do Centro de Cognição Infantil da Universidade de Yale, Bloom e sua equipe trabalham com bebês de 6 a 10 meses e utilizam dois comportamentos simples e consistentes: o estender dos braços, que demonstra preferência, e o tempo do olhar, que reflete o interesse ou a percepção do inesperado. Confortavelmente acomodados no colo dos pais, os bebês assistem a animações ou a teatros de fantoches com enredo simples, em que um dos personagens ajuda o outro, e um terceiro dificulta ou impede que o outro atinja seu objetivo. Em ambas as situações os bebês percebem a diferença entre os comportamentos, ou seja, discriminam entre o bem e o mal, e sempre demonstram preferência pelo personagem bom e rejeitam o malvado. Com insight e análise científica rigorosa, Bloom constrói a teoria e estende sua abrangência pelo estudo de crianças em situações mais complexas para revelar empatia, compaixão e senso de equidade.
Portanto, nossa vida moral tem uma base inata, que trazemos desde o nascimento. As vivências individuais e coletivas, sobretudo em família, fazem evoluir a moralidade que, no adulto, é modulada tanto pelas emoções como pela razão. Esta é uma perspectiva radicalmente nova sobre as bases do comportamento humano, e que pode contribuir para cultivar o altruísmo e a solidariedade - o bem - e para entender, e quem sabe tratar ou prevenir, a violência e os comportamentos antissociais.


Artigo publicado em Zero Hora de Porto Alegre em 22/08/2014