sábado, 10 de setembro de 2011

ENTRE A MODERAÇÃO E O PECADO

            Dia 29 de agosto. Estávamos em Istambul, Turquia. Era o último dia do Ramadã, em que os muçulmanos fazem jejum diariamente. Algo como a Semana Santa dos cristãos.
          Naquela noite, o povo estava todo na rua. As casas que vendem iguarias feitas de amêndoas, pistaches, mel e outras delícias da região regurgitavam de gente. O jejum estava terminando. Nos dias seguintes, as famílias se visitariam para saborear os tradicionais doces turcos. Durante os dias em que ali estivéramos, nos chamou atenção a enorme frequência de populares às mesquitas. Ficavam horas fazendo orações. Em volta das mesquitas, gente deitada nos bancos, com ar sofrido. Tinham de passar o dia todo sem comer, sem fumar, sem fazer sexo, sem beber, até água. Só à noite quebrariam levemente o jejum para recomeçá-lo no outro dia. Assim, foi por um mês inteiro. Agora a penitência terminava. É tempo de comer, de beber, de gozar tudo aquilo a que renunciaram por quatro semanas.
          Todas as grande tradições religiosas impõem períodos de abstinências e penitências a seus fiéis para lhes ensinar a dominar as paixões. Os gozos da vida levam ao pecado, dizem. Será? Só se não encontramos ainda o caminho da moderação, do equilíbrio.
          De repente, a Praça Taxsim, onde estávamos, é invadida por viaturas de onde descem dezenas, centenas de policiais fortemente armados que se espalham pelo centro da cidade: “Algum atentado?”, pergunto. “Não”, me responde um popular: “As pessoas hoje bebem muito, e precisam ser vigiadas”.  Pergunto a mim mesmo: terá valido a pena sacrificarem-se por tantos dias para, depois, se entregarem aos excessos?
Milton M. Moreira
Crônica Publicada no jornal Diário Gaúcho em 13/09/2011