O QUE NOS FAZ BONS OU MAUS
CARLOS
ALEXANDRE NETTO
Neurocientista
e reitor da UFRGS
Diariamente, nos
comovemos com histórias de sofrimento e solidariedade, e nos sentimos
inconformados com a injustiça e com as guerras. Somos seres morais e a
moralidade, construída a partir da percepção de bem e mal, é um dos pilares da
vida em sociedade.
Paul Bloom, psicólogo cognitivo que vem a
Porto Alegre participar do Fronteiras do Pensamento, defende que já nascemos
com algum senso de moral, de equidade e de justiça. Para comprovar sua hipótese
ele encarou o difícil desafio de estudar a mente dos bebês. Pode parecer
espantoso, mas pais e mães sabem que todos nascem com um repertório de
comportamentos que se desenvolvem rapidamente, sobretudo as expressões de
desconforto, prazer e alegria.
No laboratório do Centro de Cognição Infantil
da Universidade de Yale, Bloom e sua equipe trabalham com bebês de 6 a 10 meses
e utilizam dois comportamentos simples e consistentes: o estender dos braços,
que demonstra preferência, e o tempo do olhar, que reflete o interesse ou a
percepção do inesperado. Confortavelmente acomodados no colo dos pais, os bebês
assistem a animações ou a teatros de fantoches com enredo simples, em que um
dos personagens ajuda o outro, e um terceiro dificulta ou impede que o outro
atinja seu objetivo. Em ambas as situações os bebês percebem a diferença entre
os comportamentos, ou seja, discriminam entre o bem e o mal, e sempre
demonstram preferência pelo personagem bom e rejeitam o malvado. Com insight e
análise científica rigorosa, Bloom constrói a teoria e estende sua abrangência
pelo estudo de crianças em situações mais complexas para revelar empatia,
compaixão e senso de equidade.
Portanto, nossa vida moral tem uma base
inata, que trazemos desde o nascimento. As vivências individuais e coletivas,
sobretudo em família, fazem evoluir a moralidade que, no adulto, é modulada
tanto pelas emoções como pela razão. Esta é uma perspectiva radicalmente nova
sobre as bases do comportamento humano, e que pode contribuir para cultivar o
altruísmo e a solidariedade - o bem - e para entender, e quem sabe tratar ou
prevenir, a violência e os comportamentos antissociais.
Artigo
publicado em Zero Hora de Porto Alegre em 22/08/2014
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